terça-feira, 8 de abril de 2014

E-mail do blog

Oi pessoal! Olha, para quem quiser mandar um site, ou uma história ou até mesmo uma fanfic (história escrita por fã de alguma coisa) entrem no seu e-mail e enviem para:

livrospraleronline@gmail.com

Esse é o e-mail do blog, onde todos os funcionários (se conseguirmos algum) vão usar pelo blog.

                            Obrigada,

                                  Sabrina

Fábulas de La Fontaine

Oi! Olhem, vou fazer uma sessão de fábulas do La Fontaine! Aqui:

FÁBULAS DE LA FONTAINE

A TARTARUGA AVIADORA 
    Por La Fontaine 

                    Um certo dia, uma tartaruga encontrou-se com dois patos emigrantes. Ficou horas admirada, ouvindo-lhes contar suas grandes viagens pelo mundo a fora. 
                    Vocês é que são felizes, dizia a tartaruga, suspirando resignadamente. Eu também gostaria de viajar, mas ando muito devagar. 
                     - Por que não nos acompanha? Vamos correr o mundo a três... disse um dos patos. 
                     - Como poderei ir, se não sei nem ao menos andar depressa pelo chão, quanto mais voar por essas alturas e distâncias? 
                     - Podemos ajudá-la, fazendo como os aviadores. Nós seremos os pilotos e você irá como passageira. 
                      - Mas, meus amigos, onde está o avião? 
                      - Não se preocupe. Nós arranjaremos tudo, já! 
                      Pegaram um pau roliço e comprido, e mandaram que a tartaruga se dependurasse nele, com a boca, fortemente. Em seguida cada um  pegou uma das pontas do bastão. E lá se foram pelos ares, batendo as asas compassadamente e levando a feliz tartaruga. 
                     - Segure-se bem, "agarre-se" com força, comadre tartaruga!, gritou um dos patos. A viagem é comprida!... 
                     La da terra, os animais e as pessoas, admiradas, erguiam a cabeça, fixavam bem os olhos; estavam espantados por ver uma tartaruga voando. 
                     - Olhem, olhem, gritam alguns deles, apontando para o céu. Nunca tinha visto uma tartaruga voar! Aquela deve ser a rainha das tartarugas!... 
                    E todos riam gostosamente. 
                    A tartaruga voadora, sentia-se orgulhosa por ser admirada. 
                    - Sou mesmo a rainha, ia respondendo a ingênua tartaruga, mas não chegou a pronunciar nem a primeira silaba, porque, ao abrir a boca, soltou-se do bastão e caiu como um raio, espatifando-se no chão. 
                    Os patos continuaram seu voo, porque é o que mais sabem fazer. E ficaram comentando: 
                     - Da próxima vez que trouxermos alguém que não sabe voar, é melhor providenciarmos um paraquedas. 


MORAL DA HISTÓRIA: 
          Quando tentamos fazer algo para o qual não estamos preparados, podemos nos dar muito mal. Como se diz: " cada macaco no seu galho".  
O LOBINHO SABICHÃO 
Por La Fontaine

                   Um lobo e uma raposa tinham nascido ao mesmo tempo e crescido juntos na floresta. Lá, na cova onde vieram ao mundo, também estudaram juntos as primeiras lições de vida. 
                   Crescidinhos, os dois estudantes quiseram conhecer o mundo. 
                   Caladinhos, às escondidas, sem que os pais nada percebessem, fugiram da toca, correram uma grande distância, afundaram-se na florsta e depois começaram a perambular de mata em mata. 
                   No meio de um campo onde tinham chegado, e que lhes pareceu infinitamente extenso, estava um belo cavalo alto e gordo pastando sossegadamente, sem dar a mínima importância aos dois viajantes. 
                   Estes, quando o viram, pararam estupefatos, sem saber o que fazer. Estavam a ponto de fugir desabaladamente, pois o medo era terrível. 
                   -- Quem será? perguntou, afinal, a raposa, um tanto senhora de si. 
                  O lobinho, que se julgava um sábio, também não sabia. Como não queria confessar sua ignorância, começou a falar entre-dentes, enquanto coçava uma orelha. 
                  - Eu sei, sei muito bem. O seu nome está na ponta da minha língua! É que, no momento, não sou capaz de lembrar-me...
                  - Pois bem, propôs a raposa, o melhor é irmos perguntar-lhe, em vez de ficarmos aqui parados, enquanto a memória está falhando. 
                  Encaminhando-se para perto do cavalo, fez-lhe uma graciosa reverência e perguntou ao desconhecido: 
                  - Ilustrícimo senhor, estes vossos humildes servidores desejam saber qual o vosso nome?
                  O interpelado, a quem aqueles intrusos estavam aborrecendo, respondeu atravessadamente: 
                  - Meu nome está escrito nas minhas ferraduras. Se quiserem sabê-lo, leiam! E ergueu uma pata traseira. 
                  A raposa, muito finória, desculpou-se, dizendo que era ainda muito criança e não sabia ler bem; enquanto que o lobinho, querendo aproveitar a oportunidade para exibir-se vaidosamente diante daquele soberbo animal, foi depressa ler o nome na ferradura. 
                  O cavalo deu-lhe, então, um valente coice, atirando-o longe.
                   - Ai... ai... ai... gritou o bichinho, cheio de dores, mas ainda capaz de correr e fugir.
                  A raposa, correndo a seu lado, perguntou-lhe zombateira: 
                  - Esta lição você ainda não tinha estudado?  

MORAL DA HISTÓRIA - A soberba pode nos levar a situações perigosas. Portanto, nunca devemos fingir conhecer o que, de fato, desconhecemos apenas para satisfazer nosso orgulho.            
O LEÃO E O MOSQUITO
La Fontaine

                 Uma vez, um mosquito declarou guerra ao leão dizendo-lhe que pouco se importava com seu título de rei. Dito isto, começou a picá-lo por todos os lados, tornando-o furioso, não lhe dando trégua, até que o leão caiu esgotado. O inseto, então, se retirou cheio de orgulho, mas, enquanto ia anunciar a todos os demais bichos sua vitória, caiu na traiçoeira teia de uma aranha e lá ficou preso. 


MORAL DA HISTÓRIA
 As vitórias nem sempre são duradouras. Por isso não se deve contar vantagem antes do tempo.
O CORVO QUE QUERIA IMITAR A ÁGUIA
 La Fontaine

               Um corvo viu uma águia roubar um carneiro e pensou em fazer o mesmo. Escolheu, no rebanho, um carneiro bem gordo e foi para cima dele.  Mas o animal era bastante pesado e seu pelo muito espesso, de modo que as garras da ave ali ficaram enrascadas. E foi assim que o pastor logo acudiu o carneirinho, agarrou o corvo e o pôs numa gaiola para divertir seus filhos. 


MORAL DA HISTÓRIA 
O ladrão não deve roubar o que não pode carregar. A ganância sempre leva à desgraça. 
OS DOIS BURROS 
 La Fontaine 

                    Os dois burros caminhavam um ao lado do outro. Um carregava aveia e outro, dinheiro. O segundo, orgulhoso de sua carga, caminhava cheio de vaidade. Surgiram dois bandidos, que se atiraram sobre ele e o cobriram de pauladas para arrancar-lhe a carga. O outro burro então lhe disse: "Amigo, nem sempre é bom ter emprego importante. Se você estivesse servindo um moleiro, como eu sirvo, estaria são e salvo. 

MORAL DA HISTÓRIA 
O orgulho não leva a boa coisa. É melhor um trabalho humilde, mas digno.(Diariamente vemos noticias de pessoas que vivem de forma gananciosa e sempre acabam em maus lençóis. Isso tem ocorrido muito na política brasileira, onde os poderosos usam do seu poder e roubam o dinheiro do povo; mas no final sempre se dão mal. Deus existe!
O LOBO E O CÃO 
 La Fontaine 
              Um lobo espantosamente magro encontrou um cão gordo e bem nutrido. Não podendo atacá-lo chegou-se a ele humildemente, e o cão lhe disse que, se desejasse viver tão bem quanto ele, era só acompanhá-lo até sua casa. Mas, quando o lobo viu a marca que a coleira deixara no pescoço do cão, alegou que preferia passar fome a perder a liberdade.


MORAL DA HISTÓRIA
A liberdade é o bem mais precioso que temos. Por isso, é preciso tudo fazer e até  sacrificar-nos  para mantê-la. 
O LEÃO E O BURRO VÃO À CAÇA 
La Fontaine 
                Certo dia, um leão pensou em ir à caça e, para desentocar os animais, fez-se acompanhar por um burro, ao qual ordenou que ficasse escondido na moita, a zurrar. Os bichos da floresta, apavorados com aquela voz insólita, fugiram e foram cair nas garras do leão. O burro atribuiu, então, todo o mérito da caçada a si, mas o leão lhe respondeu: "Eu também me espantaria com seu zurro,  se não conhecesse você e sua raça."



MORAL DA HISTÓRIA
   Muitas vezes nos deixamos levar pelas aparências. 

Histórias dos Irmãos Grimm

Oi pessoal! Aqui estão algumas histórias dos Irmãos Grimm, e vocês podem ver mais
em:

 http://www.grimmstories.com/pt/grimm_contos/index


JOÃO E MARIA (HANSEL E GRETEL)

Às margens de uma extensa mata existia, há muito tempo, uma cabana pobre, feita de troncos de árvore, na qual morava um lenhador com sua segunda esposa e seus dois filhinhos, nascidos do primeiro casamento. O garoto chamava-se João e a menina, Maria.
A vida sempre fora difícil na casa do lenhador, mas naquela época as coisas haviam piorado ainda mais: não havia comida para todos.

Minha mulher, o que será de nós? Acabaremos todos por morrer de necessidade. E as crianças serão as primeiras.

- Há uma solução… - disse a madrasta, que era muito malvada. Amanhã daremos a João e Maria um pedaço de pão, depois os levaremos à mata e lá os abandonaremos.

O lenhador não queria nem ouvir falar de um plano tão cruel, mas a mulher, esperta e insistente, conseguiu convencê-lo.
No aposento ao lado, as duas crianças tinham escutado tudo, e Maria desatou a chorar.

- Não chore, tranqüilizou-a o irmão. Tenho uma idéia.

Esperou que os pais estivessem dormindo, saiu da cabana, catou um punhado de pedrinhas brancas que brilhavam ao clarão da lua e as escondeu no bolso. Depois voltou para a cama.
No dia seguinte, ao amanhecer, a madrasta acordou as crianças.
As crianças foram com o pai e a madrasta cortar lenha na floresta e lá foram abandonadas.
João havia marcado o caminho com as pedrinhas e, ao anoitecer, conseguiram voltar para casa.
O pai ficou contente, mas a madrasta, não. Mandou-os dormir e trancou a porta do quarto. Como era malvada, ela planejou levá-los ainda mais longe no dia seguinte.
João ouviu a madrasta novamente convencendo o pai a abandoná-los, mas desta vez não conseguiu sair do quarto para apanhar as pedrinhas, pois sua madrasta havia trancado a porta. Maria desesperada só chorava. João pediu-lhe para ficar calma e ter fé em Deus.
Antes de saírem para o passeio, receberam para comer um pedaço de pão velho. João, em vez de comer o pão, guardou-o.
Ao caminhar para a floresta, João jogava as migalhas de pão no chão, para marcar o caminho da volta.
Chegando a uma clareira, a madrasta ordenou que esperassem até que ela colhesse algumas frutas, por ali. Mas eles esperaram em vão. Ela os tinha abandonado mesmo!

- Não chore Maria, disse João. Agora, só temos é que seguir a trilha que eu fiz até aqui e ela está toda marcada com as migalhas do pão.

Só que os passarinhos tinham comido todas as migalhas de pão deixadas no caminho.

As crianças andaram muito até que chegaram a uma casinha toda feita com chocolate, biscoitos e doces. Famintos, correram e começaram a comer.
De repente, apareceu uma velhinha, dizendo: - Entrem, entrem, entrem, que lá dentro tem muito mais para vocês.
Mas a velhinha era uma bruxa que os deixou comer bastante até cair no sono em confortáveis caminhas.
Quando as crianças acordaram, achavam que estavam no céu, parecia tudo perfeito.
Porém a velhinha era uma bruxa malvada que e aprisionou João numa jaula para que ele engordasse. Ela queria devorá-lo bem gordo. E fez da pobre e indefesa Maria, sua escrava.
Todos os dias João tinha que mostrar o dedo para que ela sentisse se ele estava engordando. O menino, muito esperto, percebendo que a bruxa enxergava pouco, mostrava-lhe um ossinho de galinha. E ela ficava furiosa, reclamava com Maria:

- Esse menino, não há meio de engordar.

- Dê mais comida para ele!

Passaram-se alguns dias até que numa manhã assim que a bruxa acordou, cansada de tanto esperar, foi logo gritando:

- Hoje eu vou fazer uma festança. Maria ponha um caldeirão bem grande, com água até a boca para ferver e dê bastante comida paro seu o irmão, pois é hoje que eu vou comê-lo ensopado.

Assustada, Maria começou a chorar.

- Acenderei o forno também, pois farei um pão para acompanhar o ensopado, a bruxa falou.

Ela empurrou Maria para perto do forno e disse:

- Entre e veja se o forno está bem quente para que eu possa colocar o pão.
A bruxa pretendia fechar o forno quando Maria estivesse lá dentro, para assá-la e comê-la também, mas Maria percebeu a intenção da bruxa e disse:

- Ih! Como posso entrar no forno, não sei como fazer?

- Menina boba! - disse a bruxa. Há espaço suficiente, até eu poderia passar por ela.

A bruxa se aproximou e colocou a cabeça dentro do forno. Maria, então, deu-lhe um empurrão e ela caiu lá dentro. A menina, então, rapidamente trancou a porta do forno deixando que a bruxa morresse queimada.
Maria foi direto libertar seu irmão.
Estavam muito felizes e tiveram a idéia de pegarem o tesouro que a bruxa guardava e ainda algumas guloseimas .
Encheram seus bolsos com tudo que conseguiram e partiram rumo a floresta.
Depois de muito andarem atravessaram um grande lago com a ajuda de um cisne.
Andaram mais um pouco e começaram a reconhecer o caminho e viram ao longe a pequena cabana do pai.
Ao chegarem na cabana encontraram o pai triste e arrependido. A madrasta havia morrido de fome e o pai estava desesperado com o que fez com os filhos.
Quando os viu, o pai ficou muito feliz e foi correndo abraçá-los. Joãozinho e Maria mostraram-lhe toda a fortuna que traziam nos seus bolsos, agora não haveria mais preocupação com dinheiro e comida e assim foram felizes para sempre.

OS MÚSICOS DE BREMEN
Era uma vez um burro que tinha trabalhado durante muitos anos para o seu dono, acartando sacos de milho. Com o tempo, foi perdendo as forças e acabou por não conseguir trabalhar como antigamente. Então, o dono resolveu cortar-lhe a ração. Vendo que dessa decisão não viria nada de bom para si, o Burro fugiu e pôs-se a caminho da cidade de Bremen.
- Em Bremen posso tornar-me músico – pensava ele enquanto caminhava. 
Ainda mal tinha começado a jornada quando encontrou, à beira da estrada, um cão de caça que respirava sem fôlego como se tivesse acabado de correr muito.
- Por que respiras assim com tanta dificuldade? – Perguntou o Burro.
- Ah, sabes lá! Como estou velho e cada dia que passa me sinto mais fraco, já não posso caçar. O meu dono queria matar-me, mas eu fugi a sete pés. Mas, agora, o que vai ser de mim? – Queixou-se o Cão.
- Por que não vens comigo para Bremen? – Perguntou o Burro. - Vou tornar-me músico da cidade e tocar alaúde. Tu podias tocar tambor…
O Cão concordou e meteram-se ambos ao caminho.
Andaram algum tempo até que encontraram um Gato que estava muito, muito triste.
- O que te aconteceu, meu caça-ratos? – Perguntou o Burro.
- Quem é que se pode sentir feliz quando tem a vida em risco? – Queixou-se o Gato –
Como estou velho e prefiro enroscar-me à lareira em vez de caçar ratos como antigamente, a minha dona quis afogar-me e eu fugi. Mas, agora, o que será de mim?
- Vem connosco para Bremen – convidou o Burro. – Podes ser um músico como nós e tocar nos concertos nocturnos.
O Gato concordou e foi com eles.
Pelo caminho passaram por uma quinta e viram um Galo empoleirado na cancela.
Cantava a plenos pulmões.
- Por que te esganiças tanto? – Quis saber o Burro.
- Amanhã é Domingo - explicou o Galo - e a minha dona tem convidados. Mandou a cozinheira cortar-me o pescoço logo à noite e meter-me na panela. Por isso, canto enquanto posso.
- É melhor vires connosco, Galo vaidoso - convidou o Burro - tens uma bela voz e juntos faremos um belo quarteto.
O Galo concordou e partiu com os outros.
Como não podiam chegar a Bremen nesse dia, resolveram passar a noite numa floresta.
O Burro e o Cão deitaram-se debaixo de uma árvore e o Gato e o Galo aninharam-se nos seus ramos. O Galo escolheu um dos ramos do topo da árvore porque aí se sentia mais seguro. Antes de adormecer, olhou em volta e viu ao longe uma luz a brilhar na escuridão. Chamou os colegas e disse-lhes que, naquela direcção, havia com certeza uma casa.
- Vamos até lá – propôs o Burro. – Aqui não estamos lá muito bem instalados.
Todos concordaram e puseram-se a caminho. Acabaram por chegar a uma velha casa de onde saía uma luz muito viva.
Como o Burro era o mais alto, foi ele quem espreitou primeiro.
- O que vês? – Perguntou o Cão.
- Vejo uma mesa repleta de iguarias e quatro salteadores que se estão a banquetear à farta – respondeu o Burro.
- Essa comida é que vinha mesmo a calhar – disse o Galo.
- Ah, se ao menos pudéssemos lá entrar… - acrescentou o Burro, cheio de fome.
Conversaram durante algum tempo e, por fim, os quatro amigos tiveram uma ideia para expulsar os salteadores.
O Burro apoiou as patas dianteiras no parapeito da janela, o Cão saltou para cima dele, o Gato saltou para cima do Cão e o Galo voou para cima do Gato. Depois, começaram a fazer barulho, cada um à sua maneira: o Burro zurrou, o Cão ladrou, o Gato miou e o Galo cantou. Enquanto faziam este concerto, saltaram através da janela, partindo os vidros em mil bocados. Os salteadores pensaram que se tratava de um fantasma horrível
e fugiram a sete pés, rumo à floresta.
Muito satisfeitos, os quatro amigos sentaram-se à mesa e comeram tranquilamente até se fartarem. Depois, apagaram as velas e prepararam-se para dormir. O Burro deitou-se num fardo de palha que havia no pátio, o cão deitou-se atrás da porta das traseiras, o Gato enroscou-se junto das brasas da lareira e o Galo empoleirou-se numa das traves do tecto da casa. Como estavam muito cansados adormeceram num instante.
Por volta da meia-noite os salteadores voltaram. Estava tudo às escuras e não se ouvia barulho nenhum.
- Não nos devíamos ter assustado tanto – disse o chefe.
E mandou um dos seus homens à frente para examinar a casa.
O bandido entrou e dirigiu-se à lareira para acender uma vela. Os olhos do Gato luziam no escuro e o bandido pensou que eram duas brasas. Aproximou um fósforo do focinho do Gato para o acender. O Gato não gostou da brincadeira e saltou-lhe para a cara, arranhando-a muito, enquanto miava e soprava. O bandido ficou aterrorizado! Quis fugir pela porta das traseiras, mas o Cão atirou-se a ele e ferrou-lhe uma valente dentada na perna. Cada vez mais aterrorizado, o homem lançou-se a correr pelo pátio, passando perto do Burro que lhe deu dois valentes coices. Nisto, o Galo acordou em sobressalto e pôs-se a cantar:
- Có-có-ró-có-có! Có-có-ró-có-có!
O bandido fugiu o mais depressa que pode. Quando chegou perto dos outros, gritou apavorado:
- Estamos perdidos! Está uma bruxa horrorosa sentada à lareira. Cuspiu-me e arranhoume a cara com as suas unhas enormes. Junto à porta está um homem que me esfaqueou a perna. No pátio está um monstro que me bateu com um cacete. Em cima do telhado está o chefe deles todos que gritou: "Corre senão comes! Corre senão comes!" Foi o que fiz, para não apanhar mais.
Os salteadores nunca mais se atreveram a voltar àquela casa.
Quanto aos quatro músicos de Bremen, sentiram-se tão bem por lá que resolveram nunca mais sair… e, quanto a mim, ainda lá devem estar!

OS DOZE IRMÃOS

Era uma vez um rei e uma rainha que viviam felizes e em harmonia e que tinham doze filhos, sendo todos garotos. Então, o rei disse para a sua esposa:

- "Se a décima terceira criança que você está para trazer ao mundo for uma garota, os doze meninos devem morrer, para que os bens dela sejam maiores, e para que o reino possa ser dela somente."

Então, ele ordenou que doze esquifes fossem fabricados, os quais já estavam cheios de pedaços de madeiras, e em cada um havia um pequeno travesseiro para o morto, e os caixões tinham sido levados para uma sala fechada, e ele deu a chave para que a rainha guardasse, e pediu para que ela não falasse sobre isso com ninguém.

A mãe todavia, se sentava e lamentava o dia todo, até que o filho mais jovem, que estava sempre com ela, e a quem ela chamava de Benjamin, nome esse que foi tirado da Bíblia, disse a ela:

- "Querida mamãe, porque você está tão triste?"

- "Querido filhinho," respondeu ela, "Não posso lhe dizer." Mas ele não a deixava sossegada até que ela foi e abriu a sala, e mostrou a ele os doze caixões que estavam terminados e cheios de pedacinhos de madeiras. Então, ela disse:

- "Meu querido Benjamin, teu pai mandou fazer estes caixões para ti e para os teus onze irmãos, pois, se eu trouxer uma garotinha no mundo, você será morto e sepultado com eles."

E enquanto ela ia dizendo isso, ela chorava, e o filho a consolava e dizia:

- "Não chore, querida mãezinha, nós vamos nos salvar, e sairemos daqui." Mas ela disse:

- "Vai para a floresta com os teus onze irmãos, e faça com que um fique permanentemente sobre a árvore mais alta que puder ser encontrada, e fique atento, olhando para a torre aqui do castelo.

Se eu der a luz a um filhinho, eu colocarei uma bandeira branca, e então, vocês poderão se arriscar a voltar, mas se eu der a luz a uma menina, eu levantarei uma bandeira vermelha, e então, vocês deverão fugir o mais rápido que puderem, e que Deus possa proteger todos vocês. E eu todas as noites levantarei e farei uma oração para vocês - no inverno, para que vocês possam se aquecer perto de uma fogueira, e no verão, para que vocês não desfaleçam com tanto calor."

Depois que ela abençoou os filhos, eles seguiram para a floresta. Todos eles, no entanto, ficavam atentos, e se sentavam no pé de carvalho mais alto da floresta e ficavam olhando em direção à torre. Quando onze dias tinham se passado, e tinha chegado a vez de Benjamin, ele viu que uma bandeira tinha sido hasteada. Não era, no entanto, uma bandeira branca, mas uma bandeira vermelha, a qual anunciava que todos eles deviam morrer.

Quando os seus irmãos souberam daquilo, eles ficaram muito bravos, e disseram:

- "Todos nós devemos sofrer por causa de uma garota? Juramos que todos nós iremos nos vingar! - quando encontrarmos uma menina, o sangue vermelho dela deve jorrar."

Então, eles penetraram mais fundo na floresta, e no meio dela, que era a parte mais escura, eles encontraram a pequena cabana abandonada de uma feiticeira, onde não havia ninguém. Então, eles disseram:

- "Vamos ficar aqui, e tu, Benjamin, que és o menor e o mais fraco, tu ficarás em casa e cuidarás dela, nós outros vamos sair para conseguir alimento."

Então, eles foram para a floresta para caçar lebres, cervos selvagens, pássaros e pombos, e qualquer coisa que houvesse para comer, eles levavam um pouco para Benjamin, que tinha de arrumar a casa para eles, para que eles pudessem matar a fome. Juntos viveram eles na pequena cabana durante dez anos, e o tempo não parecia longo para eles.

Apequena garota, que a rainha, a mãe deles, tinha dado a luz, já tinha crescido, ela era boa de coração, e tinha um rosto encantador, e na testa dela havia uma estrela de ouro. Uma vez, quando houve uma grande arrumação no palácio, ela viu doze camisas de homens entre as coisas que estavam lá, e perguntou a sua mãe:

- "A quem pertencem estas doze camisas, porque elas são pequenas demais para serem do papai? Então, a rainha respondeu com o coração dolorido:

- "Querida filhinha, estas camisas são dos teus doze irmãos." Disse a garota, então:

- "Onde estão meus doze irmãos, nunca ouvi falar deles?" A mãe respondeu:

- "Só Deus sabe onde eles estão, eles estão andando pelo mundo." Então, ela pegou a pequena e abriu a sala para a garota, e lhe mostrou os doze caixões cheios de pedaços de madeiras e com os travesseiros para a cabeça.

- "Estes caixões," disse ela, "estavam destinados para os teus irmãos, mas eles foram embora escondidos antes que tu nasceste," então, a garotinha disse:

- "Querida mãezinha, não chore, eu irei procurar os meus irmãos."

Então, ela pegou as doze camisas e partiu, e seguiu direto para a grande floresta. Ela caminhou o dia todo, e a noitinha ela encontrou a casinha da feiticeira. Então, ela entrou na casa, e encontrou um jovem garoto, que perguntou:

- "De onde você veio, e para onde você vai?" e ficou atônito como ela era linda, e usava trajes reais, e tinha uma estrela na testa.

E ela respondeu:

- "Eu sou filha da rainha, e estou procurando meus doze irmãos, e eu irei até o fim do céu azul para encontrá-los." Ela também mostrou a ele as doze camisas que um dia havia pertencido a eles. Então, Benjamin compreendeu que ela era sua irmã, e disse:

- "Eu sou Benjamin, teu irmão caçula." E ela começou a chorar de alegria, e Benjamin chorou também, e eles beijaram e se abraçaram um ao outro como muita ternura.

Depois disto ele disse:

- "Querida irmãzinha, há ainda mais um problema. Nós fizemos um acordo que toda garota a quem encontrássemos deveria morrer, porque nós fomos obrigados a deixar o nosso reino por causa dela!"

Então, ela disse:

- "Morrerei com prazer, se morrendo puder salvar os meus doze irmãos."

- "Não," respondeu ele, "tu não morrerás, fique sentada aqui debaixo deste barril até que os nossos doze irmãos cheguem, e então, eu conseguirei entrar num acordo com eles."

Ela fez o que ele pediu, e quando a noitinha os outros irmãos chegaram da caça, o jantar deles estava pronto. E quando eles estavam todos sentados na mesa, e estavam comendo, eles perguntaram:

- "Quais são as novidades?"

Benjamin respondeu: - "Vocês não souberam de nada?"

- "Não," responderam eles. Ele continuou:

- "Vocês foram para a floresta e eu fiquei em casa, no entanto, eu sei mais do que vocês."

- "Diga-nos, então," exclamaram eles.

Ele respondeu: - "Me prometam primeiro que a primeira garota que nós encontrarmos não irá morrer."

- "Sim," exclamaram todos eles, "ela terá misericórdia, mas, conte-nos logo."

Então, ele disse:

- "A nossa irmã está aqui," e ele levantou o barril, e a filha do rei apareceu com seus trajes reais e com uma estrela na testa, e ela era linda, delicada e meiga. Então, todos eles ficaram felizes, e a abraçaram, e a beijaram e a amaram de todo o coração.

Agora ela ficava em casa com Benjamin e o ajudava no trabalho doméstico. Os onze foram para a floresta para caçar veados, pássaros e pombos, para que eles pudessem se alimentar, e a irmãzinha junto com Benjamim cuidavam da preparação da caça para eles.

Ela procurou na floresta ervas e vegetais para cozinhar, e colocou as panelas no fogo para que o jantar ficasse pronto quando os onze chegassem. Ela também mantinha a ordem na pequena casa, e colocava lindos lençóis limpos e brancos nas caminhas, e os irmãos estavam sempre felizes e viviam em grande harmonia com ela.

Um dia os dois que ficavam em casa, haviam preparado uma bela surpresa, eles se sentaram e comeram e beberam e estavam todos felizes. Havia, porém, um pequeno jardim que pertencia à casa da feiticeira onde ficavam doze pés de lírios, os quais também são chamados de "estudantes." Ela queria fazer uma supresa para os seus irmãos, e colheu as doze flores, e pensou em presentear cada um deles com uma flor durante o jantar.

Mas no exato momento que ela colheu as flores os doze irmãos se transformaram em doze corvos, e voaram pela floresta, e a casa e o jardim desapareceram também. E agora, a pobre garota estava sozinha na floresta virgem, e quando ela olhava ao redor, uma velhinha estava sentada perto dali e disse:

- "Minha criança, o que você fez? Porque você não deixou que as doze flores brancas crescessem? Eles eram teus irmãos, que agora para sempre foram transformados em corvos." A garota disse, chorando:

- "Não existe uma maneira de libertá-los?"

- "Não," disse a mulher, "só existe uma maneira no mundo todo, e isso é tão difícil que você jamais conseguirá libertá-los desse jeito, porque você precisa ficar muda durante sete anos, e não pode falar nem rir, e se você falar uma palavra, e somente uma hora dos sete anos estiver faltando, tudo estará perdido, e os teus irmãos serão mortos por causa dessa palavra."

Então, a garota falou de coração:

- "Eu tenho certeza de que libertarei os meus irmãos," e foi e procurou uma árvore bem alta e se sentou no topo dela e ficava tecendo, e não falava nem ria. Ora, aconteceu que um rei estava caçando na floresta, ele tinha um grande cão galgo que correu até a árvore onde a garota estava sentada, e pulava em torno da árvore, ganindo e latindo para ela.

Então, o rei se aproximou e viu a bela princesa que tinha uma estrela de ouro na testa, e ficou tão encantado com sua beleza, que ele a convidou para que fosse sua esposa. Ela não respondia, mas fazia pequenos acenos com a cabeça. Então, ele mesmo subiu na árvore, trouxe-a para baixo, colocou-a em seu cavalo e a levou para o seu palácio. Então, o casamento foi festejado com grande festa e muita alegria, mas a noiva não falava nem sorria.

Quando eles tinham vivido felizes juntos durante alguns anos, a mãe do rei, que era uma criatura perversa, começou a difamar a jovem rainha, e disse ao rei:

- "Ela é uma mendiga vulgar que trouxeste da caça contigo. Quem sabe que coisas horrorosas ela não faz às escondidas!"

Ainda que ela seja muda, e não consiga falar, ela poderia sorrir pelo menos, mas aqueles que não riem, tem consciências pesadas." A princípio, o rei não quis acreditar nela, mas a velha falava disso o tempo todo, e a acusava de coisas tão assustadoras, que por fim o próprio rei se deixou convencer e ela foi condenada a morte.

E aconteceu que uma grande fogueira foi acesa no pátio do palácio, onde ela deveria ser queimada, e o rei ficou em cima na janela e via tudo com lágrimas nos olhos, porque ele a amava muito. E quando ela foi amarrada bem forte à fogueira, e o fogo começou a lamber as suas roupas com sua língua vermelha, o último momento dos sete anos havia se expriado. Então, um ruflar de asas foi ouvido no ar, e doze corvos vieram voando em direção à fogueira, e pousaram, e quando eles tocaram a terra, eis que eram os doze irmãos dela, que ela tinha libertado.

E les apagaram totalmente a fogueira, extinguiram as chamas, libertam a irmã que amavam tanto, e beijaram e a abraçaram. E agora, que ela podia abrir a boca para falar, ela contou ao rei porque ela tinha ficado muda, e nunca podia ter dado um sorriso. O rei dava pulos de alegria ao saber que ela era inocente, e todos eles viveram em grande harmonia até o fim da vida deles. A madrasta má foi levada para o tribunal, e colocada dentro de um tonel com óleo fervente e cobras venenosas, e teve uma morte cruel.


Querido Diário Otário - Melhor fingir que isso nunca aconteceu (Livro 1)

Oi gente, aqui está, como prometido:

QUERIDO DIÁRIO OTÁRIO - MELHOR FINGIR QUE ISSO NUNCA ACONTECEU (LIVRO 1)

Querido Ser que Está Lendo Meu Diário, 

Você tem certeza de que deveria estar lendo o diário de outra pessoa? Talvez eu tenha dito 
que você podia ler, aí tudo bem. Mas, se você é a Angelina, eu NÃO dou permissão para que 
você leia, então pare já.

Se você é meu pai ou minha mãe, SIM, eu sei que não devo chamar as pessoas de idiotas, 
manés, abobadas, minhoquentas, tapadas e coisa e tal, mas isto é um diário e na verdade eu 
não estou "chamando" ninguém de nada. Eu escrevi isto. E, se vocês brigarem comigo por 
causa disso, então eu vou saber que leram meu diário, apesar de eu não ter dado permissão 
para vocês lerem. 

Agora, pelos poderes que fui investida, prometo que todas as palavras deste diário são 
verdadeiras ou, pelo menos, tão verdadeiras quanto eu acho que têm que ser. 


Assinado, Jamie Kelly 


P.S.: Se é você, Angelina, quem está lendo isto, então HAHA! Peguei você! Tudo aqui foi escrito 
com uma tinta envenenada, num papel envenenado. Então é melhor você correr e ligar para a 
ambulância! 

P.P.S.: Se é você, Lucas, quem está lendo isto, eu tenho um antídoto contra o veneno, e ele 
pode ser entregue a você através de um simples telefonema para minha casa. Mas, se os meus 
pais atenderem, não fale nada sobre o veneno. Acho que eles não iam gostar de saber que eu 
ando por aí envenenando as pessoas. 



 Segunda Feira, 2 

Querido Diário Otário, 


 Hoje a tarde, eu estava lá fora brincando com o meu beagle, Fedido, fazendo aquele joguinho 
em que agente finge que joga a bola, daí ele sai correndo como um bobo pra pegar e de 
repente se toca que você não jogou bola nenhuma. Eu geralmente faço isso duas ou três vezes, 
mas acho que hoje estava meio distraída, porque, quando finalmente me toquei que ainda não
tinha jogado a bola nenhuma vez, já tinha fingido umas cento e quarenta vezes. O Fedido 
estava meio irritado e espumando e não quis voltar pra casa por um bom tempo. 

 Será que os cachorros são rancorosos? 


Terça-feira, 3 


Querido Diário Otário, 


Acho que hoje eu estive muito próxima de ganhar um apelido, o que é praticamente a pior 
coisa que pode acontecer com você num colégio. Eu estava comendo um pêssego no recreio e 
o outro pêssego caiu na minha mala. O Mário Pinsetti, aquele idiota que só consegue respirar
pela boca e que, para o meu azar, estava ali do meu lado, disse: 

- Ô Pesseguilda! 

Ele é praticamente o ''apelideiro'' oficial do colégio e, apesar de serem sempre idiotas, os 
apelidos que ele dá acabam durando para sempre. (Não acredita em mim, Diário? Então 
pergunta ao ''Bundão Bundeira'', um dos primeiros apelidados por Pinsetti. Eu nem sei qual é o 
nome verdadeiro do menino. Ninguém sabe. Ele é chamado de Bundão Bundeira há tanto 
tempo que até a mãe dele já chamou de Bundão uma vez, quando estava deixando ele na 
escola. 

- Tchau, Bundãozinho! 

Quando percebeu o que tinha feito, ela tentou ajeitar: 

- Temos muito orgulho de você! 

Voltando à história dos pêssegos. Eu peguei aquela fruta maligna rapidinho e enfiei na 
mochila, achando que ninguém tinha ouvido o Pinsetti. Isso com certeza anularia a validade do 
apelido. Mas, então, uma adorável risada tilintou nos meus ouvidos como o som de alguém 
acariciando a barriguinha de um bebezinho fofo com um filhotinho macio. Quando me virei, lá 
estava ninguém mais, ninguém menos que Angelina, que estava com certeza fixando o apelido 
para sempre em sua memória. 

Agora é só questão de tempo até que eu esteja assinando meus trabalhos como PESSEGUILDA.


Quarta-feira, 4 


Querido Diário Otário, 


Hoje, o Lucas Ribas (oitavo menino mais bonito do meu ano) falou comigo no corredor. 
Geralmente, esse tipo de coisa não me afetaria nem um pouco, afinal eu ainda tenho chances
de que os Caras Bonitos Um a Sete falem comigo algum dia. Mas, quando o Lucas disse ''oi'' 
hoje, eu tive certeza de que estava completamente apaixonado por mim, por isso me senti na 
obrigação de ser irresistível.


Meus poderes irresistíveis em ação 

Hálito Fresco e perfumado de menta; 
Postura de total belezura; 
Olhos piscando de maneira adorável; 
Maravilhosos não, Belos não, Penteados, não, Alguns cabelos. 


Aí quando eu estava prestes a responder alguma coisa legal para o Lucas (talvez até uma coisa 
MUITO legal, mas jamais saberemos), a Angelina resolveu aparecer, carregando sua mochila 
com um gazilhão de coisinhas lindas e penduradas, e ficou, absolutamente maravilhosa, BEM
NA FRENTE DELE. E de propósito! Esse comportamento totalmente escorpiônico dela me fez 
até esquecer o que eu ia dizer, então a única coisa que saiu da minha boca foi uma porção de
ar sem nenhum som articulado. Não que isso tenha feito alguma diferença, porque ele estava 
olhando para a Angelina do mesmo jeito que o Fedido olhava pra bolinha uns dias atrás. 

Ficou bem óbvio que o amor dele por mim estava esguichando pelas orelhas e se espalhando 
pelo chão. Se não acredita em mim, pode perguntar para a Isabella. Ela estava ali ao lado. 

E, como se as coisas já não estivessem péssimas olhem só: 

Ele diz para a Angelina: 

- Uau, que cheirinho gostoso de Chocomenta! É do seu gloss? Adorei! 

Aí, a Angelina pára por um segundo, olha bem PARA A ISABELLA E PARA MIM e diz: 

- É, é sim. 

E abre um sorriso radiante que congela todos ao redor. 

Francamente, eu acho que chega a ser grosseiro e obsceno ter dentes tão brancos que podem
DANIFICAR PERMANENTEMENTE os olhos das pessoas ao seu redor. 


PERIGOSOS RAIOS de Brancura OFUSCANTE. 


(No caso de meus filhos estarem lendo isto daqui a muitos anos, este foi o exato momento em
que Angelina roubou o pai de vocês, Lucas, de mim, e a culpa do seu sobrenome ser 
Rumpelstiltskin ou Scharzenegger ou Bundeira é toda dela.)  

O problema é o seguinte: a Isabella é a ÚNICA menina do colégio que usa gloss de 
Chocomenta. É o sabor mais nojento já inventado, mas ela precisava ter um sabor de gloss só
dela, por isso escolheu aquele que ninguém gosta. Todas as meninas sabem que o 
Chocomenta é dela. Até a Angelina sabe disso. 

Então, Diário Otário, vamos rever essa cena em câmera lenta: em poucos segundos usando 
apenas algumas palavras, Angelina roubou meu futuro ficante/namorado/marido, e Isabella 
perdeu o sabor do gloss que é sua marca registrada. (A Isabella iria gostar mais de usar as 
calças gigantes da avó dela para ir ao colégio do que saber que todos achavam que ela copiava
a Angelina.) 


Um mistério da Natureza 

Bunda de tamanho normal da Isabella - Bundão de Elefante da avó da Isabella 

Acho que devia ter dito alguma coisa, mas sabia que a Angelina tinha o apelido de 
''Pesseguilda'' muito bem arquivado em seu Cérebro Afiado Carregado de Maldade e não ia 
pensar duas vezes antes de usá-lo diante do Lucas. 

Eu estava de mãos atadas. 

É claro, Diário Otário, que você entendeu que eu ESTOU DESTRUÍDA. O que você talvez não 
consiga entender completamente é o impacto que esse escandaloso evento está causando na 
Isabella. Ela dá MUITÍSSIMA importância para cheiros, e acho que não está preparada para 
trocar de gloss. Prevejo um período longo e doloroso de lábios ressecados. 

Acaba de me ocorrer, Diário Otário, que a Angelina é tão perfeita que a palavra ''perfeita'' 
talvez não seja perfeita pra ela. Um dia alguém vai inventar outra palavra para descrevê-la, e 
eu espero que essa palavra rime com mané ou babaca, porque eu já tenho até uma idéia para 
uma música: Princesa Mané da Manelândia. 

Quarta-feira, edição da noite 

Querido Diário Otário, 

Hoje no jantar, minha mãe anunciou que vamos tomar conta do meu primo durante alguns 
dias. Ele é tipo... sobrinho do irmão da filha da minha tia ou alguma coisa assim. 
Eu sei que os filhos dos nossos tios são nossos primos, mas também temos os primos de 
segundo grau, os primos de terceiro grau e até os primos imediatos de primeiro grau. 
Eu já tive uma queimadura de primeiro grau. 

Primo de primeiro grau 
Queimadura de primeiro grau 

Ah Diário Otário, só pra deixá-lo por dentro dos crimes culinários da minha mãe, na noite 
passada ela fez um guisado com 147 ingredientes e, ainda assim, o gosto era horrível. É difícil
de acreditar que ela não tenha conseguido fazer nenhum dos 147 ingredientes ficar bom. 

É claro que eu comi, apesar de tudo. Se você não come, tem que agüentar o sermão sobre o 
quanto ela sofre pela família e trabalha duro e como as criancinhas famintas do
Seiláondequistão iriam adorar aquele guisado. 

Eu acho que as criancinhas do Seiláondequistão já estão com muitos problemas, para ainda 
terem que agüentar os guisados da minha mãe. 



Quinta-feira, 5 

Querido Diário Otário, 

Por causa da Angelina, que acha que é a menina mais linda do mundo, mas que provavelmente 
não está nem entre as cinco mais, eu tive que comprar meu almoço no colégio hoje. Eu não 
podia correr o risco de que a minha mãe colocasse de novo um pêssego na minha mala, e aí, 
quando eu estivesse secretamente tentando jogá-lo no lixo, o Pinsetti ou a Angelina vissem e
criassem um imenso Evento de Apelido. Daí eu teria que fugir de casa.

Só para provar que o universo está do lado da perfeita e demoníaca Angelina, hoje era Dia Do
Bolinho de Carne na cantina. Quinta é sempre dia do bolo de carne. A tia da cantina, Srta. 
Bruntford, acha que é uma ofensa pessoal quando você não come alguma coisa do bufê. E ela 
faz com que a gente se sinta muito mal, principalmente se não comemos o bolinho de carne 
seboso. 

Perceba a semelhança sobrenatural entre a Srta. Bruntford e o bolo de carne. 


A Srta. Bruntford já chega perguntando qual é o problema do bolo de carne, balançando para 
todo lado aquela pelota de banha que ela chama de pescoço. No caso dela, o pescoço é mais 
uma coisa grande, gorda e mole, parecida com aquele merengue molenga que a gente coloca 
em cima da torta de limão. 

Por isso, eu não tive outra saída além de comer um pouco daquele bolo de carne com cheiro 
de gato molhado. E isso é culpa da Angelina também. É tudo culpa da Angelina. 


Uma vez, um menino tocou a banha pescoçal da Srta. Bruntford e os médicos declararam que
ele estava incuravelmente asqueroso. 



Sexta-feira, 6 

Querido Diário Otário, 



Não sei se já falei da Angelina alguma vez, mas ela é uma menina do meu colégio que é linda, 
maravilhosa, popular que tem cabelos cor de ouro (como se alguém achasse isso bonito!).

Isabella e eu estávamos no corredor hoje e a Isabella foi desesperadamente conversar com a 
Angelina quando ela passou, o que é uma tremenda demonstração de falta de noção, já que a 
Angelina está no 9 na escala de popularidade, enquanto a Isabella mal está no 5. (E agora que 
a boca ultra-seca da Isabella está sofrendo de uma tremenda falta de gloss, é capaz que ela 
caia ainda mais.) 


Escala de Popularidade 

1- Bruntford 
2- Saco de areia de gato 
3- Professores
4- Um dos sapatos velhos da Angelina
5- Isabella 
6- Onde a Isabella poderia estar se tentasse 
7- EU 
8- Onde eu deveria estar 
9- Angelina 
10- Um popstar que não seja velho 


Enfim, a Angelina só deu uma olhada para a Isabella como se ela fosse alguma coisa muito 
estranha e um pouco nojenta - como um caracol virado do avesso - e, sem dizer uma única 
palavra, seguiu em frente. 

Você já conheceu NA VIDA alguém como a Angelina, Diário? Por acaso na loja em que eu 
comprei você, tinha um outro diário supercaro que se achava tão legal que ficava andando de
um lado pra outro da loja como se estivesse com uma caneta enfiada ... na espiral? 

Honestamente, Querido Diário Otário, se HOUVESSE um diário igual à Angelina na loja, eu iria 
até lá agora para comprá-lo e usaria as páginas para recolher as cacas do Fedido quando 
levasse ele pra passear. Mas eu também lembraria que você deve ser feliz do jeito que é, 
Diário, porque você é muito lindo, e também diria pra você ficar satisfeito com o seu cabelo, 
apesar de que você não tem cabelo. Isto é, se você tivesse um cabelo que fosse muito feio. 


Outra boa idéia: Diário exibido vira lanche de bode. 

Isabella me disse mais tarde que achava que seria capaz de convencer a Angelina a abandonar 
o Chocomenta. A Isabella é muito boazinha e eu gosto muito dela, mas, se cérebros fossem 
bananas, vamos dizer que os macaquinhos que ficassem com a cabeça dela seriam meio 
magrelos. 

Einstein (macaco gordão) 
Isabella (macaco magrelo) 

Como os seus macaquinhos ficariam de biquíni? 


P.S.: Novidades sobre o apelido: Ninguém me chamou de Pesseguilda ... AINDA. A Angelina 
deve estar esperando o momento certo para atacar. É um FATO CIENTÍFICO RECONHECIDO 
que as meninas são completamente lindas e pura bondade por fora e são na realidade pura 
maldade por dentro. 

A Angelina deve estar esperando a melhor e mais vergonhosa hora para espalhar o apelido 
Pesseguilda pelo mundo. 



Sábado, 7 

Querido Diário Otário, 


Tá bem, tá bem. Eu sei que ontem mesmo escrevi que você devia ficar feliz com seu cabelo do 
jeito que ele é. Acho que eu estava tentando ser mais receptiva com pessoas com lindos e 
perfeitos cabelos loiros ou talvez estivesse querendo brincar de cientista, mas o fato é que 
hoje eu decidi comprar uma daquelas tintas para cabelo para aplicar em casa. (Talvez você 
nunca tenha percebido, Diário, mas eu tenho alguns probleminhas com meu cabelo.) 

Escolhi a tinta que mais se parecia com a cor do cabelo da Angelina, que é um tom chamado 
''Radiante Brilho do Sol''. Eu não estava tentando copiar a Angelina, foi só uma coincidência 
que essa tenha sido a primeira cor que eu peguei na quarta loja em que fui procurar. 

Eu devia ter pedido ajuda para a Isabella na hora de pintar, mas não estava muito a fim de 
ouvir sermões sobre como eu devia me aceitar do jeito que sou, enquanto fingia não reparar 
que ela estava num nível avançado de um probleminha que os médicos chamam de ''Boca de

Lagarto''. 

Por isso, eu me tranquei no banheiro e tingi o cabelo sozinha. 

(Aliás, isso me lembra de uma coisa. Descobri por que eles dizem que você muda quando pinta 
os cabelos. Mudar-se é a única coisa que você pode fazer depois e ver o resultado.) 

O que deveria ter ficado um ''Radiante Brilho do Sol'' acabou ficando com cor de galinha. Se eu 
me escondesse no meio da fazenda, acho que ninguém me achava mais. 

Então, eu tive que voltar à loja e comprar uma tintura que fizesse meu cabelo voltar à cor 
original, antes que a minha mãe ou a Isabella enchessem o meu saco por causa da minha falta 
de auto-estima. 

Tirei um chumaço do meu cabelo antigo da minha escova de cabelo para poder escolher a 
tinta, uma coisa que não tinha achado que era nojenta até que eu vi a cara da balconista 
quando eu entreguei o chumaço para ela me ajudar a achar o tom. Felizmente, eles tinham o 
tom perfeito, que eu trouxe para casa e usei para voltar ao normal. 

Aliás, lembra que o nome da cor do cabelo da Angelina é ''Radiante Brilho do Sol'', né? Pois o 
nome da cor do meu cabelo é "Porco-do-mato". 

Domingo, 8 


Querido Diário Otário, 


A Isabella apareceu muito cedo aqui em casa hoje (cedo demais, mas tudo bem, porque meu
cabelo já tinha voltado a ser a caca que a natureza fez). 

Ela veio tão cedo que até viu meu pai usando o roupão estampado ridículo dele. Ela achou que
ele parecia um zumbi mendigo, mas eu acho que ele fica BEM pior que isso. 

Enfim, a Isabella acabou de completar seu novo projeto, a Escala dos Manés, que identifica 
quanto uma pessoa pode ser mané, e é, portanto, um guia muito útil para medir a manezice 
alheia. 

A Isabella disse que foi desse jeito que o sistema métrico foi criado: alguém igual a ela acordou 
um dia e decidiu um litro era um litro e logo concordaram (apesar de ninguém saber 
exatamente quanto é um litro).

Acho que qualquer dia a Isabella vai ser Professora de Ciências da Popularidade. 

Aqui está o sistema métrico da manezice da Isabella: 


A Maravilhosa ESCALA DOS MANÉS 

De ruim a péssimo 


MONGO - Pentelho, meio fedido.
ANTA - Fala alto, geralmente fede a peixe.
SUPERANTA - Fala cuspindo. Mentiroso. Grudento. 
MANÉ - Malvado e cabeça-dura. Usa sapatos ridículos. 
LOIRIDÍCULA - Ladra de sabores de gloss. Não Gosta de sabonete. 
MANÉ-MOR - Chato demais. Futuro canibal. Roupas bizarras. 



Domingo, 8 (plantão da noite) 


Querido Diário Otário, 


Depois que a Isabella terminou de me apresentar o sistema manétrico dela, consegui 
convencê-la a ir até uma loja escolher um novo sabor de gloss. (Ela não queria MESMO fazer 
isso, mas eu a convenci. Esse tipo de pressão gentil deve fazer parte do processo de cura 
quando as pessoas perdem seres amados como o Chocomenta.) 

Apesar de ter me feito ficar horas que nem uma boba olhando enquanto ela experimentava e
rejeitava uns 40 produtos perfeitamente aceitáveis, eu tive que avisá-la que aquele pote 
jumbo que ela tinha escolhido não era gloss, e sim desodorante roll-on. 

Como você pode ver, o esforço acabou sendo em vão, mas amigas de verdade não deixam as 
outras saírem na rua com antitranspirante na boca. 

Mais nojento do que parece. 



Segunda-feira, 9 


Querido Diário Otário, 


A aula estava legal hoje. Aliás, estava MELHOR que legal. A Angelina prendeu o cabelo em uma 
daquelas milhares de coisas que ela pendura na mochila e a enfermeira do colégio – que agora 
é a minha heroína – simplesmente pegou uma tesoura e tosou um monte daquele sedoso 
cabelo loiro lá do alto da cabeça, por isso a Angelina só é a menina mais linda do mundo se 
você está à direita dela. (Pessoalmente, eu acho que ela ficaria melhor se estivesse do avesso.) 

Ah, sim, eu também fiquei sabendo que vou ter que apresentar um trabalho sobre mitologia. 
Eu perguntei para o meu professor, o Sr. Evans, o que significava ‘‘mitologia’’, e ele disse que
são coisas que não existem. Eu perguntei se isso incluía o cabelo do lado esquerdo da cabeça 
da Angelina, e todo mundo deu muita risada, exceto o Sr. Evans e a Angelina. 

O Sr. Evans disse que eu tinha que tirar 10 nesse projeto, senão eu ia acabar junto com as 
sereias: 

- Muito ‘‘mar’’. 

Superengraçado, hein? Espero que comece a crescer um cabelo bem lindo, loiro e sedoso no 
alto daquela careca, só para a enfermeira tosar tudo. 


Terça-feira, 10 


Querido Diário Otário, 


Eu sou muito esquisita? 

Tive que ir para a enfermaria hoje, porque acho que minha mãe me envenenou 
acidentalmente com uma coisa melequenta e meio macarrônica que ela preparou para o 
jantar de ontem e que tinha um gosto que parecia muito com o cheiro de meia. 

Eu achei que a enfermeira ia me dar um remédio, mas me enganei. Ela só me deu um chazinho 
e me fez ficar deitada na maca por um tempo. Claro, é bem assim que se desintoxicam as 
pessoas 

Eu morrendo 

Foi bem chato, é claro, ficar lá deitada, tentando não sentir os efeitos do envenenamento, por 
isso comecei a olhar ao redor. E foi aí que eu vi aquilo na cesta de lixo: um longo chumaço de 
cabelo, lindo e loiro. O cabelo da ANGELINA. 

Mas aqui chega a parte esquisita: eu peguei o cabelo. Não sei por que, afinal não pretendo 
fazer um vudu pra ela nem nada. 

Ainda. 

Eu tinha que ter aquele cabelo. 

Eu fugindo com o chumaço. 


Caso você esteja preocupado comigo, Diário Otário, no fim das contas eu não estava 
envenenada mesmo. A enfermeira disse que era apenas uma ‘‘dispepsia’’, que eu acho que é o 
termo médico para dizer que eu tinha dentro de mim uma imensa, gigantesca quantidade de 
gás tóxico, capaz de matar um cavalo. 


Quarta-feira, 11 


Querido Diário Otário, 

Passei o dia tentando pensar em alguma coisa para fazer com o cabelo da Angelina, Não em o 
cabelo suficiente para fazer uma peruca. Pensei em plantar como se fosse um mato, para ver 
se crescia e crescia até florescer uma cabeça da Angelina. Mas aí eu pensei que a nova cabeça 
podia ser ainda mais bonita que a original e achei melhor deixar para lá. 

Por enquanto, acho que vou só guardar como troféu, mais ou menos como aqueles caras que
penduram as cabeças dos alces que caçam na parede, exceto que, em vez da cabeça, eu tenho 
só um chumaço. 

Aliás, falando da cabeça da Angelina, ela hoje estava usando uma boina para cobrir a gadelha 
tosada.(BOINA é aquele chapeuzinho francês estúpido.) Enfim, nem dava para acreditar no 
quanto ela parecia tonta com aquilo. Acho que esse é o fim da popularidade dela. 

Quinta-feira, 12 



Querido diário Otário, 


Tipo, metade das pessoas do colégio estavam usando boinas hoje (inclusive o LUCAS!!!). É 
como se todos fossem da sociedade secreta da boina e estivessem apenas á espera de um 
sinal da Angelina para colocá-las para fora. Não dá para entender. E se a Angelina tivesse 
colocado a calcinha na cabeça? Acho que sei EXATAMENTE o que ia acontecer nesse caso. 
Metade do colégio estaria por ai, espiando através do buraco da cueca. 

Têm duas coisas a respeito disso que me incomodam mesmo: 



1) O fato de as pessoas só gostarem da Angelina porque ela é totalmente linda, legal e 

inteligente. 

2) O fato de eu não ter uma boina. 

Como toda quinta-feira, hoje foi dia de bolo de carne. A Srta. Bruntford fez o maior escarcéu 
(de novo) porque as pessoas não queriam comer aquilo, mas o pessoal que estava usando 
boina estava meio que unificado, como a resistência francesa, e a ignorou. Isso deixou ela 
ainda mais de cara, e eu percebi que o pescoção gorduroso balançava furiosamente em 
direção á Angelina,como se a Bruntford soubesse que aquilo tudo era culpa da Angelina. 

NOTÍCIAS DO CRIME DA COMIDA: minha mãe fez uma coisa tão ruim pro jantar que decidi até
correr o risco de ouvir o sermão quediaboéistico e dar a minha parte pro Fedido. Ele provou 
um pouquinho, mas acabou optando por comer o cocô do gato. 

Agora eu estou com um pouco de medo do Fedido, porque eu acho que ele vai me culpar se 
passar mal mais tarde, apesar de a culpa ser da minha mãe. Por isso, se ele pretende morder o 
pescoço de alguém durante a noite, tem que ser o dela. (Diário Otário, estou dizendo isso em 
voz alta enquanto escrevo, pro Fedido me ouvir.) 


Sexta-feira,13 


Querido Diário Otário, 


Falta menos de uma semana pro meu primo chegar. Meus pais estão em ALERTA INFANTIL DE 
SEGURANÇA MÁXIMA. 

Eles estão colocando travas especiais indestrutíveis á prova de crianças nos armários onde 
guardamos produtos de limpeza e inseticidas, porque, evidentemente, as criancinhas adoram 
beber essas coisas. 

Que trabalheira inútil. Se eles não querem que as crianças comam essas coisas, não seria 
melhor colocar sabor de brócolis nela? 


Sábado, 14 

Querido Diário Otário, 


Acho que tenho que preparar alguma coisa para aquele trabalho de mitologia do Sr. Evans. 
Pesquisei na internet e li umas coisas sobre Medusa, uma mulher que tinha cobras venenosas 
saindo da cabeça e que teria muita inveja de uma menina que tivesse cabelos de verdade, 
ainda que fossem da cor de porco-do-mato. 

Eu tenho um conselho para pessoas que têm víboras em vez de cabelo: rabo-de-cavalo. 
Tranças. Qualquer coisa.

 Eu também li umas coisas sobre Ícaro, que fez asas de cera e voou 
para muito perto do sol e aí as asas derreteram. Moral da história: se Ícaro tivesse nascido 
para voar, ele teria se tornado comissário de bordo como meu primo Terrence. 

Você sabia, Diário Otário, que a mitologia inclui coisas como duendes, gigantes e peixes 
falantes, porque não eram só os gregos e os romanos que tinham mitologia? Cara velhos e 
mortos do mundo todo tinham mitologia, o que acho que talvez seja muito interessante para 
alguém, mas não para mim. 

Sábado, 14 (plantão da noite) 


Querido Diário Otário, 

Isabella e eu estávamos passeando hoje á tarde e acidentalmente nos desviamos quase dois 
quilômetros do nosso caminho e ACIDENTALMENTE fomos parar na rua Derby, o que foi uma 
coincidência muito curiosa, porque é exatamente muito perto de onde mora o Lucas Ribas. A 
Isabella disse que ficar passando diante da casa dele desse jeito era um tipo de perseguição, 
mas eu disse que não era, porque perseguidores são loucos e nós somos muito normais, tanto 
que usamos disfarces para passar ali na frente. 

Os disfarces foram uma idéia muito boa, porque quando passamos ali pela frente o Lucas 
resolveu colocar a cabeça para fora da janela, daí a Isabella pirou e saiu correndo - mas não 
antes de me derrubar no meio da calçada. 

Consegui alcançá-la seis quadras depois. Ela pediu desculpas e explicou que só me empurrou 
antes de correr por causa de algum instinto primitivo, como se estivéssemos sendo 
perseguidas por um urso. 

Como ela tinha um bom motivo, perdoei. 


Domingo, 15 

Querido Diário Otário 


Finalmente encontrei uma boina no shopping. Custou trinta pilas, ou seja, estou dura, e eu 
nem gostei tanto assim da porcaria da boina, mas moda é moda e francamente, não sei se sou 
tão legal assim para ignorar a moda. Esse tipo de coisa é difícil de saber. 

Eu conheço uma história de uma menina que mudou de escola e tentou ignorar uma 
supermoda, tipo a das calças cargo, sei lá. O destino foi cruel: a própria família a obrigou a 
casar com um primo de primeiro grau, e ela ficou doida. Pensando bem, não sei se isso tem 
alguma coisa a ver com calças cargo e acho que é proibido casar com primos, mesmo que 
sejam de milionésimo grau. Acho que é tudo mentira, menos a parte da moda das calças cargo 
e da insanidade. 

Enfim, estou com sono e já é hora de dormir. Vou obrigar meu cérebro a sonhar que um sapo 
gigante engole a Angelina, e daí um porco-do-mato come o sapo, e daí o porco-do-mato é 
transformado em um presunto bem esquisito, e eles servem esse presunto no aniversário da 
Angelina, e todo mundo passa mal, inclusive a Angelina, que estava magicamente viva de novo
e comeu o presunto asqueroso de porco-sapo-Angelina. 

Eu nunca me lembro dos meus sonhos, mas eu vou saber se sonhar com isso, porque vou 
acordar de noite com dor na barriga de tanto rir. 


Segunda-feira, 16 


Querido Diário Otário 


A moda da boina passou. Enquanto eu jogava minha boina de TRINTA PILAS no lixo, fiquei 
pensando em como a moda podia ter passado tão rápido. Você também quer saber como, 
Diário? Calma... 

Hoje, na aula de ciências, o Sr. Tweeds fez um testezinho oral, com uma questão para cada um. 
Ele me perguntou isso: 

- Como você descobre para onde é o Norte usando uma agulha? 

E eu respondi: 

- Encontro alguém inteligente e fico ameaçando furá-lo com a agulha até que ele me diga onde 
é o Norte. 

Acho que essa não era bem a resposta que ele queria, mas eu não percebi o que ele queria até 
ele me mandar pra diretoria. 

Aliás, Diário, eu acho que os diretores são uma espécie de parentes distantes dos dinossauros. 
Os dois comem muito, são feios, têm cara de bobo e um ZILHÃO de anos. Aliás, acho que 
tinham até que mudar o nome de diretor para DINetor. 

Ah. A propósito, eu resolvi o Mistério do Fim Repentino da Moda das Boinas. A caminho da 
sala do diretor, eu vi que todas as mulheres da secretaria estavam usando boinas. 

Muito obrigado, queridas. Da próxima vez, vou preferir correr o risco de casar com o primo 
Terrence. Nossa, olha isso, DIÁRIO OTÁRIO: enquanto eu estava na diretoria, o diretor pegou a 
pasta com minha ficha para anotar essa última esperteza minha. (Essa ficha, como você deve 
saber, persegue você durante toda a sua vida escolar e só é destruída quando você casa ou 
morre) Quando ele puxou a minha pasta, eu vi, ali, bem pertinho da minha ... A FICHA DA 
ANGELINA. 

Nesse momento, eu descobri meu propósito na vida: possuir essa ficha e espalhar todo seu 
conteúdo maligno pelo mundo, para revelar á humanidade a verdadeira ladra de namorados e 
de sabores de gloss que ela é. 

Opa. Fiquei tão empolgada escrevendo essa última parte que acabei derrubando meu diário na 
cabeça do Fedido, que já estava dormindo. Acho que ele está me xingando na língua dos 
cachorros neste momento. 

Terça-Feira, 17 

Querido Diário Otário, 

Tentei pensar em alguma coisa para fazer pro meu trabalho de mitologia, porque a data de 
entrega está muito próxima e está na hora de começar a fazer algum progresso em relação a 
começar a dar alguma bola para esse trabalho idiota. Eu quero fazer o trabalho, do fundo do 
meu coração, mas acho que estou sofrendo uma crise de TOC por causa da ficha da Angelina. 

TOC, caso você nunca tenha ouvido falar, Diário, é a sigla para transtorno obsessivo-
compulsivo, que acontece quando você fica obsessivo e compulsivo com as coisas. Isso faz 
você pensar tanto sobre alguma coisa que você faz coisas mongas, como lavar as mãos mil 
vezes por dia, ou abrir e fechar o armário várias vezes para ter certeza de que não esqueceu 
nada ou ficar dizendo para você mesma "Eu tenho que ter a ficha da Angelina". 

Enfim, como isso é um problema puramente psicológico, e não causado por germes, acho que
dá para pegar até assistindo a um programa de TV sobre TOC, que, aliás, foi como eu peguei. 

Obviamente, minha mãe vai deixar eu faltar á aula amanhã, afinal, estou doente. 

Ah! Mais uma coisa: o pedaço careca da cabeça da Angelina está praticamente invisível. Ela 
deve ter usado alguma técnica de penteado derivada de uma tecnologia militar secreta para 
camuflar a carecona, que até então ela estava cobrindo com a boina. Também pode ser que o 
cabelo tenha simplesmente se regenerado, mais ou menos como as lagartixas regeneram o 
rabo cortado. 


Quarta-Feira, 18 


Querido Diário Otário, 

Minha mãe não me deixou faltar á aula hoje. Mas, tudo bem, porque eu estou milagrosamente 
curada do meu TOC e nem penso mais na Angelina. Nem ligo. Vou até provar. Abaixo, vou 
escrever os nomes de pessoas para as quais eu não dou a mínima. 


George Washington, Ringo Starr, Christina Aguilera, Zeus, Angelina,Mariana Ximenes, Juçcelina 

Kubitscheck, Angelina, Djavan, Cleópatra, Nefertiti, Greta Garbo, Angelina, Pérola, a Fada do 

Parque, o teletubby amarelo, Angelina, ANGELINA, ANGELINA, ANGELINA, ANGELINA. 



Quinta-Feira, 19 

Querido Diário Otário, 

Tá bem, tá bem. Talvez a Angelina ainda me incomode um pouquinho. Mas eu TINHA que 
pegar a ficha dela, e o único jeito de fazer isso era ser mandada de volta pra diretoria. Então, a 
hora do lanche, a Bruntford - pescoço gordo com a tia da cantina embutida - perdeu a cabeça e 
disse que ninguém podia sair da cantina até que o bolo de carne tivesse acabado. Ela ficou nos
encarando, nós ficamos encarando ela. Dava para sentir o cheiro da tensão no ar: um cheiro 
bem melhor que o do bolo de carne, por sinal. 

De repente, um pedação seboso e brilhante de bolo de carne passou voando por cima de 
nossas cabeças e espatifou-se exatamente no pescoção gordo da Bruntford. Ela começou a 
gritar, xingar e perguntar quem é que tinha feito aquilo. Parecia a oportunidade perfeita, por 
isso eu disse que eu tinha jogado a coisa. Um atalho para a sala da diretoria! Mas olhe só: 

Enquanto ela me arrastava para fora da cantina como se eu estivesse no linha direta, fui 
olhando para as bandejas de todo mundo. Eu vi bolo de carne, bolo de carne, bolo de carne ... 
e, de repente,uma bandeja sem bolo de carne. Quando olhei para cima, vi que a dona da 
bandeja era Angelina, e ela estava limpando o molho das mãos com um guardanapo. 

ANGELINA!!! Ela tinha jogado o bolo de carne, e eu tinha levado a culpa! 

Claro que eu levei uma bronca do diretor e tive até que ouvir o sermão quediaboéistico. Além 
disso, ele me proibiu de comer na cantina durante duas semanas (De certo, ele achou que esse 
castigo era muito ruim mesmo...) 

Para deixar as coisas ainda piores, é claro que não peguei a ficha da Angelina ( Pô, o que eu 
podia fazer? Acertar o diretor com um chutão de caratê, catar a ficha e sair correndo?) Enfim,
minha idéia foi muito idiota. Nunca mais vou fazer uma coisa tão boba. 


Sexta-Feira, 20 

Querido Diário Otário, 

Eu fiz uma coisa muito boba. No intervalo entre as aulas, eu vi o diretor conversando com a 
Srta. Andrea, que é professora, ou seja, velha, mas que é bonita e faz o maior sucesso com o 
diretor e com todos os professores. Aproveitei a deixa, corri até a diretoria e pedi para falar 
com o diretor. Ele não estava lá (dã) e a secretária pediu pra eu voltar depois, mas eu disse que
tinha um assunto particular para tratar com ele, será que dava para deixar um bilhetinho? E 
também disse que, com aquela boina, ela parecia uma líder de torcida. Claro que ela me 
deixou entrar e tudo que eu tive que fazer foi abrir a gaveta do arquivo e pegar a ficha da 
Angelina. Eu sei o que você está pensando, Diário Otário: você acha que eu sou a menina mais 
inteligente do mundo. E você está certo. Eu sou a menina mais inteligente do mundo. 

Horas depois, a menina mais inteligente do mundo esqueceu a ficha da Angelina no colégio. 
Numa SEXTA-FEIRA. Que beleza, vou passar o fim de semana com TOC. 


Sábado, 21 

Querido Diário Otário, 

Qual é mesmo o nome daquele bichinho que tem uma cabeçona e dentinhos afiados? Ah, é: 
Dudu. Minha tia deixou meu primo Dudu aqui hoje, com sua cara permanentemente melada e 
sua mochilinha dos robôs ninja. Ela tinha uma longa lista de coisas de que ele gostava e de que 
não gostava, mas, acima de tudo, era fundamental deixar ele bem longe de morangos, porque
ele é alérgico. 

Minha mãe fica o tempo todo limpando ele, mas, tipo, três minutos depois ele está melado de
novo. Ele parece um doce que exala a própria cobertura. Minha mãe ficou de cara quando eu 
escrevi "me lave" na cara dele com o dedo. 


Domingo, 22 


Querido Diário Otário, 

A Angelina usa um xampu tão chique e maravilhoso que aquela mechinha de cabelo deixou a 
casa toda com um cheiro melhor. A mecha também tem efeitos poderosos sobre o Dudu, que 
parece ter desenvolvido adoração por ela, além de uma habilidade mutante de cheirar tudo e
encontrá-la onde quer que esteja. 

Minha teoria científica é que, já que um dia o Dudu vai ser carinha, ele já está instintivamente
e naturalmente apaixonado pela Angelina. O cabelo não exerce nenhum efeito sobre o meu 
pai, mas segundo a Isabella é porque ele é meu pai e deixou de ser um carinha quando 
conheceu minha mãe. 

O perfume também parece exercer algum efeito sobre o Fedido, que fica fungando quando eu 
coloco a mecha de cabelo no focinho dele. Será que isso é bom ou ruim? 


Segunda- Feira, 23 

Querido Diário Otário, 

Tenho boas e más notícias. Uma boa notícia é que a minha mãe disse que minha tia vem 
buscar o Dudu na quinta, o que é um alívio, porque eu não aguento mais esconder a mecha de 
cabelo da Angelina. Tem mais: lembrei de trazer a ficha da Angelina para casa. Mas eu deixei 
ela num lugar e, quando virei as costas, tinha desaparecido. Eu sei que foi o Fedido ou o Dudu 
que pegou, mas não houve gritos, brinquedos e ossos escondidos que fizessem alguém 
assumir. E olhe que o Dudu adora os ossos. 


Terça- Feira, 24 

Querido Diário Otário, 

Estou ficando maluca de saber que a ficha da Angelina está em algum lugar desta casa e eu 
não consigo achar. Já procurei até na casinha do Fedido, o que significa que tive que fuçar no 
meio de todas as tralhas e lixo que ele guarda ali. Desde então, o Fedido tem me observado 
com olhos muito, muito estranhos. Acho que ele está planejando alguma coisa contra mim. 

Talvez eu deva comprar uma dúzia de gatos enormes e malvados para ter em casa, só pro caso 
de algum cachorrinho mau querer fazer alguma coisa contra mim. (Diário Otário, estou lendo 
isso em voz alta para o Fedido ouvir, mas acho que ele não deu muita bola. Seu eu 
desaparecer, espero que a polícia procure pegadas, ou patinhas, ou impressões patais, sei lá 
como é o nome dos rastros que um beagle culpado deixa por aí. Aliás, boa idéia para achar a 
ficha: impressões digitais.) 


Quarta- Feira, 25 

Querido Diário Otário, 

Por fora, estou brava ... 
... mas por dentro estou enfurecida. 

Finalmente terminei o trabalho de mitologia, apesar de todas as distrações. Tinha o meu primo 
Dudu arranhando a porta do quarto para entrar e tinha também a frustrante idéia de que 
poderia haver alguma coisa tão maravilhosamente horrenda na ficha de Angelina que a 
reduziria a um pedacinho minúsculo, trêmulo e lacrimejante de nhaca. Ah, se eu soubesse 
onde foi parar essa ficha! 

Felizmente, minha mãe me disse que o Dudu não vai mais encher o saco: amanhã cedo minha 
tia vai encontrar minha mãe lá no meu colégio para levá-lo de volta. 

Será que vou sentir falta de ter o pentelhinho pela casa? Bem, eu não sinto falta daquela 
doença da coceira de bunda frenética que o Fedido teve, então acho que não vou sentir muita 
falta dele também. 


Quinta-Feira , 26 

Querido Diário Otário , 

O Fedido comeu meu trabalho de mitologia. Bem, pelo menos agora eu sei o que ele esteve 
planejando. Ele estava esperando que eu terminasse o trabalho. E sabe por que eu tenho 
certeza que foi vingança ? Ele só comeu as palavras. Sério: as margens do papel ficaram no 
pratinho dele, como bordinhas de pizza . 

Tive que fazer meu lanche hoje de manhã, já que estou proibida de comer no colégio. Só tinha 
um restinho de geléia de morango para colocar no sanduíche, o cachorro sarnento lambeu a 
geléia do pão enquanto eu fui à geladeira pegar uma caixinha de suco. Acho que ele só fez isso 
porque está com gosto de mitologia na boca – e deve ser um gosto muito horrível – então nem
fiquei muito brava com ele. Minha mãe terminou de empacotar o lanche e colocou ele na 
minha mochila. 

Então, lá estava eu, Diário Otário , sendo deixada no colégio já sabendo que ia ganhar um zero
do Sr. Evans. Pô, eu não PODIA dizer para ele que o cachorro tinha comido o trabalho. Tenho 
que admitir: aquele beaglezinho do mal me ferrou bonito. 

Enquanto eu estava entrando no colégio, minha tia e minha mãe se encontraram lá fora e 
estavam preparando a transferência do Dudu de um carro pro outro quando, de alguma 
forma, ele escapou. 

Eu só sei disso porque, enquanto dava meus passos no corredor da morte em direção à aula do 
Sr. Evans, um pequeno selvagem grudento passou correndo por mim carregando uma 
mochilinha dos robôs ninja, seguido pela minha histérica tia. Eu estava quase agarrando o 
Dudu quando vi o Lucas e rapidamente tive que decidir se iria ajudar um membro da família 
em apuros ou se ia parecer legal para um cara que mal sabe que eu existo. 

- Oi , Lucas ! – foi o que eu disse, enquanto o Dudu virou no corredor e sumiu de vista, seguido 
pela minha tia que já estava começando a chorar. 

Entrei na aula do Sr. Evans plenamente consciente de que seria a primeira a apresentar o 
trabalho. Ele me mandou levantar a apresentar lá na frente da sala . 

Mal eu comecei a dizer que não tinha feito, o Dudu entrou correndo na sala. A cara dele estava 
imensa, a língua supergordona, então não dava pra entender nada do que ele dizia. Foi ai que
eu me toquei que o Fedido não tinha lambido o pão – quem lambeu foi o Dudu! 

E, pelo jeito, ele é mesmo alérgico a morangos. Ele estava tão inchado que parecia um 
desenho dele MESMO que alguém tinha feito num balão. 

O Dudu enxergou a minha mochila no mesmo momento em que eu percebi que ele estava 
usando seus poderes sobrenaturais de localização de mechas de cabelo, então nós dois 
corremos até a mochila ao mesmo tempo. Mas o bebê-demônio foi mais rápido que eu e 
conseguiu enfiar sua cabeçona redonda dentro da mochila antes que eu pudesse segura-lo. 

Quando consegui tira-lo dali , ele estava com o cabelo da Angelina grudada naquela cara 
gosmenta, como se fosse uma barba. Com aquelas roupas sujas, a barba e aquela cabeçona 
inchada, ele nem parecia humano. 

O fato de eu estar agarrando o Dudu pelo pescoço enquanto ele chutava e socava o ar 
também não devia criar nenhuma impressão de humanidade nele. 

O Sr. Evans ficou de pé, muito vermelho, com aquela veia enorme latejando na testa e 
perguntou: 

- Você conhece essa ... criança , Jamie ? 

 Foi ai que eu me dei conta de que a próxima coisa que saísse da minha boca definiria o meu 
destino para sempre. Eu seria conhecida como a garota com o primo doido ou pior: dava pra 
ver que o Mario Pinsetti já estava anotando algumas idéias de apelido num papel. Miserável.

Fiquei com vontade de atirá-lo pela janela do segundo andar. 

Foi ai que aconteceu. O Dudu tinha jogado o saquinho do lanche para fora da mochila, e o que 
vem rolando pára bem diante de mim? Um PÊSSEGO. Minha mãe colocou um pêssego na 
mochila. 

A Angelina levantou-se. Esse era o momento. A oportunidade perfeita. Ela tinha esperado o 
momento ideal, e ele tinha chegado. 

A Angelina foi até a frente da sala e parou ao meu lado. Ela soltou um daqueles sorrisos 
angelínicos e perfeitos e disse: 

- Sr.Evans, Jamie e eu fizemos nosso trabalho juntas. Nosso tema são os duendes. E este é o 
nosso auxilio visual – disse ela, apontando para o Dudu. 

Ela não me chamou de Pesseguilda. Ela não fez nada de mau. A Angelina estava ME 
AJUDANDO. O Sr. Evans e toda a sala, inclusive o Lucas, pareciam estar sob o impacto gigante
da voz da Angelina, que é a mais bela de todas as vozes mortais, mais e daí? 

Era eu quem estava na reta. Então, entrei no jogo. Nós duas começamos a inventar e falar, e 
de vez em quando o Dudu rosnava, e a sala toda caia na gargalhada, até que eu acho que ele
começou a gostar. Logo percebi que aquele era o melhor trabalho que eu tinha apresentado 
na vida, e olhe que eu estava até gostando de apresentá-lo. Assim que terminamos, minha tia 
apareceu na porta para levar o Dudu embora, e eu e a Angelina ganhamos um 10 e uma salva 
de palmas. (A Isabella teve que segurar muito para não rir. A boca dela está tão seca que 
qualquer vestígio de sorriso parte tudo e os lábios dela viram salsichas vermelhas.) 

Quando voltei para a minha mesa, fiquei pensando: 

PORQUE É QUE A ANGELINA TINHA ME AJUDADO? Será que é porque levei a culpa no crime 
do bolinho de carne? Será que agora nós somos amigas? Pensar nessa possibilidade me deixou
com dor de barriga. Aliás, eu fiquei TÃO mal que o Sr. Evans me mandou para a enfermaria. 

Quando me abaixei para fechar minha mala, vi a mochila de robôs ninja caída ali do lado e, 
dentro dela, a ficha da Angelina. Passei a mão nela e corri para a enfermaria. 

A enfermeira fez o que ela sempre faz. Não importa que você esteja sofrendo um ataque do 
coração, que uma das suas pernas tenha sido arrancada por um urso ou que tenha um 
machado enfiado na sua cara, ela sempre manda fazer a mesma coisa: TOMAR UM CHAZINHO 
E DEITAR NA MACA. 

Enquanto eu estava deitada lá, fiquei olhando para a pastinha da ficha da Angelina. Antes de
abrir, pensei em tudo o que poderia ter ali: bruxaria, seqüestro, banimento dos jogos de 
futebol do colégio por ficar piscando para os atacantes... 

Ou talvez ela esteja cumprindo a pena de ser uma pessoa de quem as pessoas gostam, apesar
de lá no fundo todos tentarem odiá-la com todas as forças. 

Só o que restava fazer era abrir a pastinha, ler a ficha e espalhar pelo mundo seus terríveis 
segredos. 


Sexta-feira, 27 



Querido diário Otário, 


A Angelina sentou perto de mim e da Isabella hoje, no intervalo. Eu estava comendo um 
sanduíche de queijo e presunto que eu tinha preparado pro lanche, mas não tinha mais queijo
lá em casa, e eu me senti meio culpada por estar sendo tão má com o Fedido ultimamente 
então dei a ultima fatia de presunto pra ele. Acho que dava para dizer que era sanduíche de 
margarina, mas eu me esqueci de passar margarina no pão. 

(Aliás, Fedido e eu somos amigos de novo. Acho que ele pensou que comer o trabalho tinha 
nos deixado quites. Pensando bem, acho que ele até que pegou LEVE). 

Enfim, voltando à Angelina (lembra a Angelina?). 

Acredite se quiser, entre uma mordida e outra no meu pão, eu cheguei a dizer: 

- Obrigada por me salvar com o trabalho ontem. 

Eu não quis ser gentil. Mas meus pais fizeram lavagem cerebral em mim e eu acabo sendo 
gentil de vez em quando, mesmo contra meus instintos. 

Aí, ela sorriu pra mim. E não foi um sorriso olha-como-eu-sou-perfeita-com-meus-dentes-
brancos-e-hálito-puro. Foi um sorriso normal. E ela até disse: 

- A gente devia fazer alguma coisa qualquer dia. Ir ao cinema, sei lá. E você tinha que me 
ensinar como fazer isso com o cabelo – ela disse isso apontando pra mim cabeça – porque eu 
nunca consigo fazer nada de legal com o meu. 

Só que eu sei, Diário Otário, é que no minuto seguinte a Bruntford estava me aplicando uma 
manobra de Heimich, tentando fazer com que eu cuspisse um pedaço de pão que ficou 
entalado na minha goela quando a Angelina elogiou o meu cabelo. Depois de alguns apertões, 
lá veio o pão, e eu vi que o Pinsetti estava ali do lado, rindo. É claro que ele já tinha algum 
apelido maravilhoso na ponta da língua e todos estavam esperando para ver qual seria, 
quando a Angelina empurrou ele pro lado e disse: 

- Ah, cala a boca, SPINHETTI. 

SPINHETTI. Era a obra-prima dos apelidos. Tinha a ver com o nome dele, era grosseiro porque 
falava das espinhas e todo mundo estava na cantina ouvindo no momento em que foi usado 
pela primeira vez. Apesar de ele estar totalmente aniquilado, ainda deu para ver que o 
respeito ainda estava estampado na cara do Mário. 

A Angelina, que todos pensavam que fosse boa e pura, tinha finalmente mostrado a maldade
que eu e a Isabella sabíamos que estava ali. 

Claro, ela só foi má com o Spinhetti (nossa, já até esqueço qual é o nome dele) e, sim, ela meio 
que salvou a minha pele de novo por impedir que ele me desse um apelido, mas , poxa pelo 
menos agora o mundo sabe que ela não é um anjo total e perfeito. 

Eu sei o que você esta pensando, Diário Otário: 

Dane-se! Use aquela minha famosa seqüência de golpes um-dois-um! Afinal, eu tenho a ficha 
dela para mostrar ao mundo. Posso acabar com ela de uma vez por todas. 

O problema é que eu não tenho mais a ficha. Ontem, eu decidi não ler a ficha da Angelina. 

Quando saí da enfermaria, fui até a sala do diretor e coloquei a ficha de volta no arquivo. 

Além do mais, é a Angelina, será MESMO que ela podia ser tão má assim? 

A boca da Isabella voltou ao normal poucas horas depois do lanche. Parecia um milagre. Os 
lábios passaram de dois pedacinhos de charque amassados e sangrentos para duas glamorosas
e reluzentes fatias de mamão. 

Foi o bolo de carne. A carne misteriosa com que ele é feito tem algum tipo de incrível poder 
regenerativo sobre os lábios da Isabella. E, agora, esse é o novo sabor de gloss dela. Ela 
colocou um pouco de bolinho dentro de um tubinho velho e anda com ele por ai. Eu sei. É 
nojento. Mas o cheiro é melhor que Chocomenta. 

Mas essa foi apenas a segunda coisa mais estranha que aconteceu no universo hoje. 
Mais tarde, na escola, a Angelina caminhou em minha direção. 

- Esqueci de agradecer você – ela disse; 

- Pelo quê?

-Por assumir a culpa naquela história do bolo de carne da Bruntford. 

E nesse momento, quando ela disse aquilo, que ACONTECEU. Eu senti o universo inteiro 
ranger, estalar e movimentar-se de leve, e só o que sei é que os terríveis poderes angelinicos 
estavam atuando sobre mim. Eu senti que talvez estivesse começando a GOSTAR DA 
ANGELINA CONTRA MINHA VONTADE. 

Eu disse para ela que não tinha problema. Eu também não quis fazer aquilo 

- Não, não, foi muito importante para mim – ela disse – Você não sabe como eu estaria ferrada 
se me pegassem. Se você pudesse ver a minha ficha, teria uma idéia. Uma coisinha a mais e eu 
seria expulsa, ai o Lucas seria todo seu, e eu NÃO vou deixar que isso aconteça. 

Aí, ela sorriu e foi embora. 

E eu fiquei parada ali, Diário Otário, mais ou menos como um beagle de olhinhos pretos vendo 
alguém remexer seus lixos e tralhas, achando que era uma coisa que na verdade não era. 

Fiquei paralisada por uma montanha de sentimentos de carinho e ódio misturados, como uma 
das receitas da minha mãe. 

Talvez, as pessoas sejam como o bolo de carne: remédio eficaz e veneno mortal. 

Fiquei pensando, quando o Mário Pinsetti passou por mim sem nem olhar na cara, se um dia 
eu encontraria a sabedoria do Fedido e conseguiria descobrir exatamente qual é a quantidade 
de justiça que deveria ser aplicada nesse caso, que seria equivalente a comer um trabalho da 
Angelina qualquer dia e dizer que estamos quites. 



 Muito obrigada por me ouvir, Diário Otário.